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Mensagens

A mostrar mensagens de novembro, 2006

homenagem

uma pausa. na azáfama feliz - e em azert - de uma semana de descanso. de surpresas, de vendas nos olhos. para agradecer a mobilização de uma mão cheia de dedos que surgiram de todos os lados num conluio secreto que se revelou num abraço denso e quente. internacional. movidos pela batuta do maestro do meu coração. sorriso. ainda não fiz anos, mas posso dizer que esta prenda ficará e-ternamente tatuada na minha pele.

bagagem

enrolo as meias e a roupa interior. viro as peças delicadas do avesso. faço uma marca em cada item que já está. não esquecer o pente e o amaciador. puxo com força os esticadores e transformo a mochila no mais redonda possível. depois, estendo um braço e o outro. os dedos tocam o esboço de ar que já não me pertence. espreguiço-me feita gata preguiçosa. em pontas de pé, soam os acordes da caixa de música. chão negro. madeira macia aquece os pés. deslizo numa dança minha, de melodias incertas. as ancas vagueiam, o peito arqueja. o cabelo perde-se no caminho. então, lentamente, a música estende-se, envolve-me. e no seu colo ondulo. ondas cada vez mais encaracoladas. espirais apertadas. toda a minha pele perde as noções da sua geografia, entrega-se nesse abraço aconchegado onde o cheiro é das pintas de canela e me respira ao ouvido. baila, bailarina, baila. pequenina pequenina. já cabes na bagagem. vamos? vamos.

monte redondo, 14 de novembro de 2006

[ms] Palavras soltas: "espectacular", "fantásticos", "puro deleite", "adorei", "quem me dera vê-los outra vez", estas foram algumas das expressões proferidas pelo grupo de alunos [...] que assistiram, no dia 7 de Novembro, à vossa representação [...]. O entusiasmo, desde a recepção invulgar à correria informal ou "infernal", foi a nota constante nos rostos dos nossos adolescentes ávidos por um texto que nunca pensaram diverti-los tanto. As nossas aulas ganharam um novo "sabor", pois a motivação e a compreensão é já outra, por isso o nosso muito obrigada, já que não nos foi possível fazê-lo no final do espectáculo. Não obstante, a nós, professores, veio-nos à memória o outro extenso grupo de alunos que, por razões diversas, não puderam fruir desse momento único, daí que tivemos a veleidade, quiçá o atrevimento, de almejar a vossa presença na nossa instituição. Sabemos que o pedido é ambicioso, mas a nossa vontade é ma

a porta do lado

entrava de manhã e ao meu "bom dia" já tinha a madalena e a italiana à minha frente na mesa. o rapaz do antiquário já lá estava, na mesa ao pé da porta, virado para a rua, com silêncio e um cigarro. eu chegava normalmente à hora em que acabavam de preparar os almoços e as sobremesas e se sentavam na mesa do fundo com as suas canecas e o jornal ou o catálogo da perfumaria. tomavam, por assim dizer, o pequeno-almoço comigo. muita conversa trocada. viravam as cadeiras na direcção da minha mesa e perguntavam opiniões. sobre tudo e sobre nada. por vezes estavam mais silenciosos e eu então prendia os cantos do meu livro no pires do bolo e saboreava os primeiros momentos do cigarro e das letras, antes de respirar fundo e seguir para a tortura. ao almoço sempre foi a confusão total. os turistas e os habituées, o cheiro forte da comida. eu ia sempre para a sala do fundo, era mais calmo. sozinha ou acompanhada, era em modo automático que me aparecia o tentador cheesecake à frente, o ca

curtas dum regresso ao passado

numa passagem pelo bairro da minha infância a comprar o melhor frango assado do mundo, uma paragem para aquecer os beiços [congelados pelo vento frio] com um café e a melhor delícia folhada do mundo. sentada nas cores, sons e pessoas do meu tempo das papoilas, ouço o talhante [ainda por ali anda, ainda lá vai beber o café quando fecha o estaminé] dizer: "custa três mil reis" com a dicção perfeita de época: mérreis . à saída do café, uma menina brinca rodando agarrada a um sinal de trânsito. espalha-se no chão de palmas das mãos directas na calçada. senti perfeitamente o ardor da gravilha a cortar-me a pele, como me acontecia com frequência, na estrada da praceta, no tempo das papoilas. gemi e tudo. já a caminho de casa, nariz no ar. o nevoeiro acumulava-se em gotas nas pestanas. com o reflexo dos candeeiros parecia que tinha chorado daqueles choros de antigamente. em que a alma se despejava toda no sal sincero de um qualquer amuo sentido. o nevoeiro cheirava nitidamente a um

horario de inverno

porque é que como ser humano, animal de hábitos, não consigo habituar-me a estas noites que começam antes de o meu dia terminar? porque é que acordo demasiado cedo, com aquela espertina de já haver muita luz? porque é que, mal se vai a luz, eu me quero ir daqui para fora? olhar para o relógio e... não, ainda falta muito tempo. tempo que se arrasta e o céu cada vez mais escuro. o consolo está apenas no cheiro cortante do frio ao sol, quando saio de casa. e das castanhas, quando saio do emprego. salvam-se[-me] as noites de chá, Chet Baker e manta polar... o meu gato enroscado em mim... diziam-me, se calhar para me consolar, que este horário era para os meninos que moravam longe da escola acordarem cedo e não ser de noite. ora eu nunca percebi isto, nem os meninos. eu também me levantava cedo para ir para a escola e preferia ir de noite e voltar para uma tarde inteira de brincadeiras na praceta. e não ter de fazer os TPCs à luz do maldito candeeiro.

pais revoltados

não, não me refiro aos problemas do encerramento de escolas por esse país, nem às culpas que sempre se depositam nos professores por os meninos não aprenderem nada a não ser asneiras. nem sequer da revolução cultural com que tenho sonhos semi-eróticos em que os pais proibiriam os filhos de ver as Floribellas e os Morangos e eles iam á falência e as produtoras eram obrigadas a fazer coisas de jeito... falo da reacção do meu público-alvo-patronato à gravação do cd do Ruca. chego ao escritório às 9 da noite de 5ªfeira, venho buscar trabalho para fazer durante a madrugada, tendo em conta que terei de faltar a tarde de 6ª e tenho um projecto para paginar [poupem-me os comentários tipo "és mesmo parva, porque é que levaste trabalho para casa? o patrão P. nem vai ler isso, é sexta-feira!"]. ao chegar, encontro o patrão Porthos, o patrão P. e a madame M. [mãe-galinha-agente-produtora de uma das nossas jovens vedetas e nova colaboradora em certos projectos], todos ainda de volta dos c

I'm a rock star... kind of

e se eu começasse a conversa com: "vou gravar um cd!" perguntariam: "um cd? de música?!" eu responderia: "sim, sim..." faria um sorriso malicioso. continuaria: "ligaram-me em desespero de causa. precisavam de uma voz feminina com características muito precisas. vou para estúdio já amanhã." provavelmente receberia uma cara entupida de surpresa, sem saber bem o que dizer. sairia algo como "ena pá! que fixe... parabéns, pá!" depois, um algo mais recomposto "então e é para sair quando?" ao que eu, sempre confiante e sorridente, responderia: "no Natal..." perguntar-me-iam, obviamente "já? caramba! e a banda é conhecida?" eu soltaria uma gargalhada: "é tua conhecida... a banda sou eu... sou a vocalista. com um coro a fazer backgroud vocals e uma participação especial." "bolas, que fantástico... e é novo, o projecto?" eu diria: "não é novo, teve início em Inglaterra já há uns tempos. mas a

simple pleasures

[ms] romper com cuidado a embalagem. enfiar os dedos e sentir a macieza do bloco de folhas de tabaco ainda prensado. apanhar um pedaço e devagar ir desfiando as folhas em pequenos fios aromáticos.

ela aos sabados de manha

[ms] nalguma poça mergulhava o pente. desdentado. alisava o cabelo à força de cuspo, empurrava-o, prensava-o de mãos decididas para o que no espelho de águas turvas e folhas secas acreditava ser o seu lugar. depois ajeitava o xaile e seguia para a igreja. na barriga sempre uma irrequietação. esperava. observava as emoções sempre iguais. os ciumentos, os jocosos, os beatos, os orgulhosos, os divertidos, os ansiosos, os enfastiados. mas ela mantinha-se à sua distância de cheiros azedos e sussurros ininteligíveis. falava consigo, à flor da pele. esperava pelo branco que lhe turvasse os olhos e os farrapos em cintilantes gotas de fantasia. os fantasmas chegavam, um a um. desfilavam pelo corredor de tapete vermelho. ouvia a música. a banda sonora de outras vidas diluía-se no ritmo badalado no seu peito, das suas cantigas. levantava o pescoço e fechava com força os dedos nos galhos secos. no cetim feito teia de aranha de um laço de fios chorões. os seus passos haviam deixado de fazer diferen