sobe polegar, sobe a calçada
sobe lenta porque isto não anda nada
ponto de embraiagem
travão de mão
puxa, baixa, acelera, tanto não
pára arranca um metro à vez
chegarás ao destino amanhã, talvez
dói o joelho do acelerador
convive, polegar, convive com a dor
a besta do lado meteu-se à bruta
vai-te a ele polegar
chama-lhe filho da puta
sobe polegar, sobe a calçada
em dia de greve e chuva é piada
a espera, as unhas, cigarros e fome
é bom saber que o povo não dorme
sobe que sobe
sobe a calçada
adaptação livre - e extremamente fraca em termos de métrica ou criatividade - do poema de António Gedeão
hoje, ao sair de casa, recebo uma sms: "se tivesse a minha casa [em Lisboa], não estava há duas horas na Padre Cruz. V."
lembrei-me de um episódio... à nossa ;)
há uns anos, em dia de greve geral dos transportes públicos, o meu jipinho resolveu simplesmente entrar em coma em plena entrada da Calçada de Carriche, fila do meio, à beira da placa que dizia Lisboa.
foi uma manhã épica: eu e a V, fechadas no carro, a ver os outros passarem com má cara porque não conseguíamos meter o meu na berma, à espera do reboque que demorou duas horas a chegar porque, claro, também apanhou com a fila.
estávamos sem tabaco.
éramos jovens.
começámos por muito profissionalmente ligar para os respectivos trabalhos [a minha patroa das nails, com BMW e casa na Av. de Berna não compreendeu muito bem o conceito de greve geral dos transportes públicos...].
falámos, enervámo-nos, momentos de silêncio.
angústia.
depois... música em altos berros [o problema não era, portanto, da bateria...], a dançar feitas parvas. uma gaja tem de fazer qualquer coisa para que o tempo passe.
começou a agravar-se a ressaca da nicotina. descemos ao mais baixo: abri as janelas e pedíamos aos carros que passavam/paravam ao nosso lado se nos dispensavam um cigarrinho...
estranhamente, no trânsito de um dia de greve geral, perante duas raparigas desesperadas num carro avariado, o mundo suburbano meteu a mão na consciência e deixou de fumar... e de ter tabaco.
daí a pouco fomos notícia nacional. toda a gente sabia, pela rádio, que "está um carro avariado na faixa do meio do acesso à Calçada de Carriche, o que está a piorar ainda mais as coisas". insensíveis.
quem deu um cigarrinho à Polegar e à V, quem foi? o senhor polícia que chegou de mota, e muito simpático, com o colega nos ajudou a empurrar o carro até à berma, parando o trânsito para podermos atravessar as faixas.
lá se foram embora, aconselhando cautela [só faltava dizer "olhe lá a velocidade, hem?"], e nós ficámos à espera até sermos salvas pelo reboque.
um dia bem passado, que me foi parcialmente cortado do ordenado, com possibilidades de recuperar o dinheiro fazendo dois turnos de unhas de seguida...
p.s.: uma nota para os senhores grevistas: se querem a simpatia do povo para com a vossa causa, que tal mudarem de estratégia? em vez de pararem a cidade e lixarem a vida a toda a gente, mantenham o metro a funcionar mas deixem as portas abertas e desliguem as máquinas de bilhetes... prejudicam os senhores patrões maus e deixam os pobrezinhos ir ganhar a vida... hem? que tal?
sobe lenta porque isto não anda nada
ponto de embraiagem
travão de mão
puxa, baixa, acelera, tanto não
pára arranca um metro à vez
chegarás ao destino amanhã, talvez
dói o joelho do acelerador
convive, polegar, convive com a dor
a besta do lado meteu-se à bruta
vai-te a ele polegar
chama-lhe filho da puta
sobe polegar, sobe a calçada
em dia de greve e chuva é piada
a espera, as unhas, cigarros e fome
é bom saber que o povo não dorme
sobe que sobe
sobe a calçada
adaptação livre - e extremamente fraca em termos de métrica ou criatividade - do poema de António Gedeão
hoje, ao sair de casa, recebo uma sms: "se tivesse a minha casa [em Lisboa], não estava há duas horas na Padre Cruz. V."
lembrei-me de um episódio... à nossa ;)
há uns anos, em dia de greve geral dos transportes públicos, o meu jipinho resolveu simplesmente entrar em coma em plena entrada da Calçada de Carriche, fila do meio, à beira da placa que dizia Lisboa.
foi uma manhã épica: eu e a V, fechadas no carro, a ver os outros passarem com má cara porque não conseguíamos meter o meu na berma, à espera do reboque que demorou duas horas a chegar porque, claro, também apanhou com a fila.
estávamos sem tabaco.
éramos jovens.
começámos por muito profissionalmente ligar para os respectivos trabalhos [a minha patroa das nails, com BMW e casa na Av. de Berna não compreendeu muito bem o conceito de greve geral dos transportes públicos...].
falámos, enervámo-nos, momentos de silêncio.
angústia.
depois... música em altos berros [o problema não era, portanto, da bateria...], a dançar feitas parvas. uma gaja tem de fazer qualquer coisa para que o tempo passe.
começou a agravar-se a ressaca da nicotina. descemos ao mais baixo: abri as janelas e pedíamos aos carros que passavam/paravam ao nosso lado se nos dispensavam um cigarrinho...
estranhamente, no trânsito de um dia de greve geral, perante duas raparigas desesperadas num carro avariado, o mundo suburbano meteu a mão na consciência e deixou de fumar... e de ter tabaco.
daí a pouco fomos notícia nacional. toda a gente sabia, pela rádio, que "está um carro avariado na faixa do meio do acesso à Calçada de Carriche, o que está a piorar ainda mais as coisas". insensíveis.
quem deu um cigarrinho à Polegar e à V, quem foi? o senhor polícia que chegou de mota, e muito simpático, com o colega nos ajudou a empurrar o carro até à berma, parando o trânsito para podermos atravessar as faixas.
lá se foram embora, aconselhando cautela [só faltava dizer "olhe lá a velocidade, hem?"], e nós ficámos à espera até sermos salvas pelo reboque.
um dia bem passado, que me foi parcialmente cortado do ordenado, com possibilidades de recuperar o dinheiro fazendo dois turnos de unhas de seguida...
p.s.: uma nota para os senhores grevistas: se querem a simpatia do povo para com a vossa causa, que tal mudarem de estratégia? em vez de pararem a cidade e lixarem a vida a toda a gente, mantenham o metro a funcionar mas deixem as portas abertas e desliguem as máquinas de bilhetes... prejudicam os senhores patrões maus e deixam os pobrezinhos ir ganhar a vida... hem? que tal?
Comentários
Deliciosa estória (agora, quando é contada :)).
Gostei muito da adaptação, que não está nada fraca.
Adoro esse poema!
Um beijo
Daniel
estou a pensar convidar a Odete Santos a dizer este poema, que tal? :)))
Gostei de saber a história toda. Como sabes também eu faço a Calçada mas provavelmente já tinha passado ou ainda estava a caminho. De qualquer maneira não fumo, por isso não ia ajudar muito a amenizar o vosso desespero. Quanto ao senhores grevistas essa opção não lhes é viável só por causa de um pormenor: os passes. Já estão pagos, são o grosso do lucro. Essa tua opção nunca faria a mossa que fez hoje. A que horas é que costumas empanar por ali? ;-)
acho que têm de haver outras alternativas, pá. se é para estragar a vida a toda a gente, poucos ficarão do lado deles. só criam antipatia...
vou passando por ali por volta das 9:30 e ao fim do dia (este é mais variável).
levo carro porque, ao contrário da maior parte destes rabos tremidos, a minha vida não tem horários e os transportes para casa são limitados... mesmo assim é mais rápido para mim levar o carro para Lx do que ir de autocarro/metro/a pé... quero ver quando vierem as portagens... humpf. de certeza que não se vão lembrar do pormenor de fazerem uns grandes silos automóveis ao pé das estações-chave... só dinheirinho!
ando a poupar para uma vespa e acabar com a minha agonia ;)
Um beijo
Daniel
"patroa das nails"? Essa eu não sabia...
qto à história c o jipinho... hilariante! Mas querida, o objectivo da greve é mesmo esse... lixar a vida a toda a gente, pra que cause impacto, pra que tenhamos mais noção da importância de certas funções e da injustiça a que este governo as devota. ;) tempo de antena sindical... lolol
beijo
colher: eu bem sei q o objectivo é lixar as pessoas e mostrar a falta que fazem. mas os utentes do metro sabem a falta que lhes faz o dito transporte, não é a eles que é preciso alertar ou demonstrar o que quer que seja.
estão em guerrilha por causa (sempre e inevitavelmente) dos dinheiros. dinheiros não é conosco, que já pagamos passes e bilhetes e pagamos impostos. sou de esquerda mas não sou tão ferrenha assim que me permita ver com bons olhos estas coisas de infernizar a vida a quem não tem culpa nenhuma nem outro meio de chegar ao trabalho...
marcar a posição pela greve é um direito (a que alguns não têm acesso, diga-se de passagem)... mas no geral as greves são feitas de formas estúpidas e simplistas, para não dizer simplórias: o que interessa é chatear toda a gente, incomodar quem não tem culpa e passar uns dias/horas a mais em casa (porque a maioria não fica de folga para ir para as manifs). isto não é greve, é aproveitamento.
a negociação pela greve no século XXI também é um jogo de marketing e teriam mais simpatizantes da causa se fizessem as coisas de forma cativante para o público em geral, direccionando os prejuízos para as entidades devidas, em vez de criar hostilidades e nervos e filas de manhãs inteiras...