tomo a auto-estrada, saída do laranja quente.
sigo no azul escuro, molhado, prateado pela - ironia - lua cheia.
chego ao branco pálido de uma vila adormecida, encontro a igreja.
de novo o cheiro enjoativo das flores. coroas, cruzes, dedicatórias de nomes que conheço de infância.
de novo aquelas pessoas. os fatos e as gravatas, os saltos agulha.
um mundo que já não visitava há muito tempo.
a minha mãe está triste, o meu pai desorientado. está bonito, com a camisa preta e o blazer cinzento.
miro os rostos da minha adolescência, encontrando-os nas paredes de madeira elegante, iluminados pelos écrãs dos computadores. estão na mesma, há tanto tempo. uns mais velhos, um pouco. cabelos mais curtos ou mais compridos. o mesmo casaco dela. a mesma camisa aos quadrados, ruça dele, a gola alta da outra.
o estranho furor da menina pequenina, que lhes chegava às ancas. "estás bonita" "estás mulher" "lamento muito".
uma filha fala comigo e encontro nela traços delicados, a força e doçura interiores que admiro. o nariz é do pai.
o pai dela está ali, deitado.
não volto a ouvir a voz grave, poderosa. nem reverei aqueles olhos azul-água fortes e penetrantes. o fumo incessante do tabaco vorazmente absorvido nos dedos grossos.
recordo-o pelas pessoas, cá fora. uns amigos de fato que davam as pancadas nos ombros. os outros, os do escritório, que lhe tinham um respeito roçando o receio. suavam em bica quando tinham de lhe falar, cabeça baixa, olhar meio submisso.
morreu mais um da geração carreira. que desistiu quando a carreira acabou.
desta geração herdámos a vontade dos nossos pais de tirar o curso, remédio para todos os males deles, apenas mais um papel nos nossos recibos verdes.
não me encontro nesta vontade. vejo como a falta de sonhos nos pode tirar a outra vontade, de viver, quando a nossa função por nós (?) escolhida neste mundo termina.
diferenças, mágoas à parte, agora não vale a pena, não é?
descansa em paz, padrinho.
sigo no azul escuro, molhado, prateado pela - ironia - lua cheia.
chego ao branco pálido de uma vila adormecida, encontro a igreja.
de novo o cheiro enjoativo das flores. coroas, cruzes, dedicatórias de nomes que conheço de infância.
de novo aquelas pessoas. os fatos e as gravatas, os saltos agulha.
um mundo que já não visitava há muito tempo.
a minha mãe está triste, o meu pai desorientado. está bonito, com a camisa preta e o blazer cinzento.
miro os rostos da minha adolescência, encontrando-os nas paredes de madeira elegante, iluminados pelos écrãs dos computadores. estão na mesma, há tanto tempo. uns mais velhos, um pouco. cabelos mais curtos ou mais compridos. o mesmo casaco dela. a mesma camisa aos quadrados, ruça dele, a gola alta da outra.
o estranho furor da menina pequenina, que lhes chegava às ancas. "estás bonita" "estás mulher" "lamento muito".
uma filha fala comigo e encontro nela traços delicados, a força e doçura interiores que admiro. o nariz é do pai.
o pai dela está ali, deitado.
não volto a ouvir a voz grave, poderosa. nem reverei aqueles olhos azul-água fortes e penetrantes. o fumo incessante do tabaco vorazmente absorvido nos dedos grossos.
recordo-o pelas pessoas, cá fora. uns amigos de fato que davam as pancadas nos ombros. os outros, os do escritório, que lhe tinham um respeito roçando o receio. suavam em bica quando tinham de lhe falar, cabeça baixa, olhar meio submisso.
morreu mais um da geração carreira. que desistiu quando a carreira acabou.
desta geração herdámos a vontade dos nossos pais de tirar o curso, remédio para todos os males deles, apenas mais um papel nos nossos recibos verdes.
não me encontro nesta vontade. vejo como a falta de sonhos nos pode tirar a outra vontade, de viver, quando a nossa função por nós (?) escolhida neste mundo termina.
diferenças, mágoas à parte, agora não vale a pena, não é?
descansa em paz, padrinho.
Comentários
Porque acredito que consegues, é que te deixo um beijo.