[ms]
num dia de chuva, triste e mal disposto, entre claustros vazios apenas o chiar das rodas.
dores e pesos em mãos demasiado fracas para enfrentar o carrego. as costas gritam e os pés latejam. espera. ainda falta.
horas depois, fecha-se a porta e o cinza do céu espera do outro lado das pedras.
o corpo cede, treme, pede açúcar. moedas contadas, não vai dar para almoçar.
regresso, não quero. não mais telefones. não mais écrãs brancos à espera de palavras. as palavras não estão aqui. trago-as comigo. mas não as posso deixar aqui. são levadas no vento, que só ele as ouve e pode ouvir.
hoje não me sinto. talvez, se a chuva vier, eu sinta finalmente no seu bater o contorno do meu corpo.
penso na infância. nos dias de chuva, em que as gotas me pingavam do cabelo comprido, me manchavam a roupa e arrepiavam. e com um sorriso abria a boca e bebia da chuva a pureza encantada dos acreditares.
que a chuva deixava o cabelo mais brilhante. que a pele molhada me fazia bonita.
o chegar a casa e a toalha turca. o vapor na banheira, bolhas e um livro. sim, desde menina, o vapor na banheira, bolhas e um livro. a água quente a arrepiar-me de novo, no choque da pele arrefecida com o choro do céu. o cheiro a perfumes de rosas da Avon, que a avó comprava para mim.
depois cortei o cabelo. a avó não trouxe mais perfumes de rosas para o banho e apanhar chuva eram ataques de asma.
tenho uma gabardine vermelha e o cabelo voltou a crescer. estou à espera da próxima chuvada.
Comentários
cada chuvada nova pode ser melhor e mais adocicada que anterior ou não.
a cada chuvada tudo se renova.
as energias e as vontades também se renovam...é pensar que a próxima é melhor
bjs
Molhas as histórias com ondas de beleza..
Um beijo
Daniel
Pronto, já arranjei novo sonho de consumo;)!
Beijinhos coloridos
Dos outros tipo de chuva não gosto, especialmente os do chove-não-chove :(