se há dias que parecem por dizer, é do incompleto pretérito imperfeito onde vives.
onde te vou buscar para um pouco de festas no cabelo ou umas meias porque tenho os pés frios.
os meus pés lembram-se de ti e o coração ainda te ouve cantar. apesar de já não me lembrar da voz sei que era aguda e trinada como nos filmes antigos e não me lembro bem mas era assim. e confesso que se me atravessa um grão na garganta.
há papoilas lá fora. perderam-se da primavera mas fizeram-se à estrada porque as memórias não se esvaem do nosso mapa genético só porque o dia não trouxe sol.
é um consolo pequeno mas é consolo da família do abraço de vento que sinto de vez em quando. não me sais do sangue e da lista das saudades e do riso de miúda pequena e das coisas que dizias que eu digo e que ainda me chamo ao espelho e da obstinação e do revirar de olhos silencioso de quando em vez.
sento-me a conversar com os pés no teu colo.
eu estou bem, sossegada, sossega, em dias azuis como tanto gostavas que eu tivesse. tenho-os aqui, na palma da mão ou não fosse eu polegar das mãos cheias de tinta que sabes que não sou de assim-assim e se não tenho azul vou ali misturar e agarro no pincel com a tua vontade que me sopras no ombro. eu estou bem, já te disse, que os altos e baixos são caminho e os pés doem às vezes mas são os meus pés que o calcorreiam e o peito ainda me deixa recuperar o fôlego. de mãos dadas, contei-te?, sim, contei, que fui logo a correr contar-te desde o primeiro dia em que deixei que me dessem a mão. o que tu te riste, sei que te riste de certeza quando viste os meus olhos espantados a ver, a dizer que deixei que me dessem a mão. por isso o azul, aquele azul, percebes agora?
enrodilho-me meio dorida e olho para as meias nos pés. penso em ti.
feliz aniversário, avó.
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beijo enorme* *