acordo atrasada, meu costume. arranjo-me e saio. está muito frio, mas está sol. pego no carro, ligo o auricular do telemóvel e o rádio, esse bom companheiro. faço-me à estrada. uns quilómetros depois, noto que há um banco de nevoeiro. mais à frente ainda, é o céu nublado que me espera. entro em Lisboa. carros e construções finas, os topos de gama de um país que não tem dinheiro para hospitais, reformas ou fomentar o emprego, mas gosta de estádios bonitos. sigo pela 2ª circular, entro numa estrada menos concorrida, com prédios altos e maltratados, de gente, e cito, "que não interessa ao menino jesus". whatever. mais abaixo, já quando se adivinha o rio, passo por edifícios muito antigos, quase ruínas, não fossem as cortinas nas janelas a evidenciar que ainda moram lá pessoas. não consigo evitar pensar como serão as suas vidas, idades, se terão frio, hoje está tanto... gosto de inventar as suas histórias, que não conheço, normalmente guardo-as para mim. já me julgam maluca o suficiente.
passo naquela curvinha da estrada onde normalmente, no meio do betão, nasce uma papoila na primavera.
depois do viaduto do comboio, viro para a rua do teatro. há um centro de recuperação de toxicodependentes. portanto, muito arrumador de carro, muito carro para arrumar, porque há por aqui escritórios e gente com os seus carros topo de gama que sempre dispensam umas moedinhas. normalmente, há porrada, também.
já assisti a um polícia que teve de meter uma rapariga pelos cabelos dentro do carro. no largo, normalmente, esses, que vivem no limbo da consciência, que abdicaram de sentir, sentam-se nos bancos e deixam-se ficar, catatónicos, ao sol, com a companhia de algum cão vagabundo e as garrafas de cerveja e vinho. havia um, que já morreu, que tinha um pombo que o seguia. o pombo agora está a morrer. às vezes têm as suas desavenças territoriais, de um contexto que nós, que vivemos de uma forma diferente, não conseguimos compreender. desatam ao murro. murros débeis de quem não tem força sequer para levantar a cabeça e seguir.
hoje não.
dois deles desencantaram um maço de tabaco vazio e jogavam à bola. como dois putos. sorriam e gargalhavam. outros, poucos, sentados, assistiam e torciam pela "equipa" que preferiam.
naquelas bocas degradadas, naqueles olhos sem vida, vi o brilho de uma vida que gostava que tivessem.
estaciono. quase não tenho dinheiro para o almoço, mas o medo que me risquem o carro faz-me dar o resto das moedas ao "crostas" que, de jornal enrolado, me avisou que havia lugar.
estão a abrir as portas do teatro. por minha causa, eu sei. se fosse por eles, começavam a trabalhar lá para as 4 da tarde.
o meu querido assistente de produção ainda não chegou. já lhe liguei duas vezes. é um rabo de sono. já sei que vou passar-me com ele.
subo para o escritório, acendo o computador e o aquecedor. vejo os mails, ligo a rádio online. recebo um telefonema de uma revista. boa, o trabalho já começa a compensar. imprimo uma carta, envelopo, ponho o post-it, tem de seguir esta tarde, correio azul.
passo naquela curvinha da estrada onde normalmente, no meio do betão, nasce uma papoila na primavera.
depois do viaduto do comboio, viro para a rua do teatro. há um centro de recuperação de toxicodependentes. portanto, muito arrumador de carro, muito carro para arrumar, porque há por aqui escritórios e gente com os seus carros topo de gama que sempre dispensam umas moedinhas. normalmente, há porrada, também.
já assisti a um polícia que teve de meter uma rapariga pelos cabelos dentro do carro. no largo, normalmente, esses, que vivem no limbo da consciência, que abdicaram de sentir, sentam-se nos bancos e deixam-se ficar, catatónicos, ao sol, com a companhia de algum cão vagabundo e as garrafas de cerveja e vinho. havia um, que já morreu, que tinha um pombo que o seguia. o pombo agora está a morrer. às vezes têm as suas desavenças territoriais, de um contexto que nós, que vivemos de uma forma diferente, não conseguimos compreender. desatam ao murro. murros débeis de quem não tem força sequer para levantar a cabeça e seguir.
hoje não.
dois deles desencantaram um maço de tabaco vazio e jogavam à bola. como dois putos. sorriam e gargalhavam. outros, poucos, sentados, assistiam e torciam pela "equipa" que preferiam.
naquelas bocas degradadas, naqueles olhos sem vida, vi o brilho de uma vida que gostava que tivessem.
estaciono. quase não tenho dinheiro para o almoço, mas o medo que me risquem o carro faz-me dar o resto das moedas ao "crostas" que, de jornal enrolado, me avisou que havia lugar.
estão a abrir as portas do teatro. por minha causa, eu sei. se fosse por eles, começavam a trabalhar lá para as 4 da tarde.
o meu querido assistente de produção ainda não chegou. já lhe liguei duas vezes. é um rabo de sono. já sei que vou passar-me com ele.
subo para o escritório, acendo o computador e o aquecedor. vejo os mails, ligo a rádio online. recebo um telefonema de uma revista. boa, o trabalho já começa a compensar. imprimo uma carta, envelopo, ponho o post-it, tem de seguir esta tarde, correio azul.
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