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clac clac

enquanto escrevo no teclado, as minhas unhas novas fazem aquele barulhinho esquisito, clac clac...
tenho umas unhas novas... apoio para o Sax...
tempo houve que eu fazia unhas de gel. pois... era técnica de unhas...
para muitos (os meus pais incluídos "tens tu um curso para isso!") é um trabalho menor... uma manicure.
ontem revivi os movimentos, as dores, os cheiros, e as emoções que nunca passam para quem está de mão estendida.
tem de haver jeito de mãos, noção da individualidade de cada um, de cada formato, de cada curva, defeito transformado em feitio.
é de dores e traumas musculares que é feito. horas seguidas sentada, as clientes a perguntarem se não dá para dar um jeitinho sem marcação "é só aqui esta unha", "é só pintar", sem terem noção de que estamos ali muito tempo, mão nova, unha nova, cola, corta, lima, esculpe, pinta, rebrilha.
é um trabalho quase artístico. lida com a auto-estima das pessoas. lida com pessoas.
é um trabalho que depende sempre do sorriso para os outros, mesmo cansado. foi ali que aprendi.
é um trabalho que implica o tão indesejado contacto físico... ali damos as mãos. ali, as tias dão as mãos às empregaduchas de centro comercial.
e surgem surpresas: gente que me chorou sentada no banco cor-de-rosa, gente que me obrigou a levantar e beber um café, comer um bolo. prendas, abraços e beijinhos perfumados.
uma miúda que tinha cotos em vez de dedos, e que saiu de lá, um mês depois, com umas unhas pequeninas, brilhantes como os olhos orgulhosos de uma batalha complicada vencida contra os vícios de anos.

ontem troquei experiências e dicas com a rapariga que me atendeu, que durante hora e meia teve as minhas mãos nas mãos.

e lembrámos a malograda D. Milú. a dona do estaminé onde trabalhei.
e onde me armei pela primeira vez em agente sindical. porque queria mais trabalho em menos tempo. porque queria que apontássemos cada lima que gastávamos, e que tivéssemos apenas meia hora de pausa. que não se fumasse de bata, e que não estivéssemos sem bata fora do stand para que não parecesse fechado. que não comêssemos de bata, que não comêssemos no stand, que não saíssemos do stand nas horas paradas.
ora eu passei-me, e com a claque das meninas da Parfois a assistirem à cena atrás da montra cheia de malas, pus a senhora habitualmente toda composta (no seu cabelo amarelo armado, a maquilhagem definitiva, a roupa sempre branca com sapatos e malas cor-de-rosa choque cheios de pindurezas) toda rosa-choque (a combinar com a mala e a agenda da Hello Kitty), com a veia do pescoço a saltar-lhe da maquilhagem definitiva, e as garras de 5 centímetros completamente cravadas na almofadinha. e quando me atira com o "ou é assim, ou não é", eu respondi "então não é. a minha carta de demissão chegar-lhe-à às mãos em menos de uma semana, não vou renovar o contrato". ficou em estado de choque, gaguejou, implorou. e lá ficou com a sua cara de rabiosque lipo-sugado.
é uma chatice perder uma das melhores funcionárias, ainda que as raparigas brasileiras façam turnos duplos, folgas e fins de semana sem se queixarem.
algumas clientes tiraram as unhas (de gel, hã...), porque não queriam outra pessoa. a D. Milú continua cor-de-rosa, rica, de BMW, casa na Av de Berna, a explorar (agora ucranianas). eu ganhei as cores que tinha perdido de passar tanto tempo sem teatro. a B ligou-me uma semana depois de eu me demitir para saber se eu queria ir fazer um Auto da Índia para o... Teatro Ibérico...
já lá vão mais de 2 anos e meio...

clac clac clac

Comentários

Indibiduo disse…
E eu faço Clap clap clap. Palmas para a polegadas.

É assim mesmo. Deves ser cá de uma fibra...
Anónimo disse…
Recentemente houve quem me cantasse, numa noite de despedida, regada com vinho e Ice tea, "Põe tua mão na mão do meu senhor... ". Já nem me lembro a que propósito, é verdade. E quem és tu para falar de cabelos amarelos, hein?
André Parente disse…
Era disso mesmo que eu precisava... Ucranianas. ;)
A sensação que retiras da tua visita à manicure retiro-a eu do tempo em que trabalhava nas livrarias. De centro comercial ao lado dos stands onde as mãos das dondocas eram alvo de todas as atenções.
Não são boas recordações. Também não são más. Mas são marcantes e muito.
Beijinhos
miak disse…
Primeiro foi o "suor"...a fazer dançar...
Depois...estranho...unhas a fazerem sorrir...
No meio e sempre...o polegar...de anel misterioso.
Curioso...as realidades que não conhecemos...e vamos descobrindo.
polegar disse…
run away man: tenho dias menos all bran... :P
linha recta: errrrr... isso era se calhar do vinho, hã?? e os cabelos amarelos eram trabalho! ;)
kwan: ao ler-te pensei que precisavas de umas unhas novas eheheh
cass: no meu caso as recordações são sempre mistura de bom e mau. ganhei uma noção do trabalho e do atendimento ao público que me tornam mais exigente e também mais simpática para os empregados...
miak: bem vindo. olha, sinceramente cada pessoa é uma caixinha de surpresas diferente. eu gosto de pessoas :)
Rantanplan disse…
Este teu post é um ponto de partida para uma sinopse de um argumento do Almodovar. Se ele o apanha...
Anónimo disse…
nunca tinha pensado nisso nestes termos... hummmm... vou registar na SPA! :P

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